sexta-feira, 21 de dezembro de 2007
Fim
apenas para aquecerem as tuas.
As minhas mãos existem
apenas para se enlaçarem nas tuas.
Tenho lábios apenas para que exista
a possibilidade de te beijar.
Cada centímetro da minha pele
tem como único propósito
ser tocado por ti.
Os meus pulmões só funcionam
para eu sentir o teu cheiro.
Os meus olhos vêm somente na tua direcção.
O prazer que me dá a minha beleza
é o que tu sentes quando me vês.
A única utilidade dos meus pés
é caminharem até onde tu estiveres.
Deixo de existir quando não estás.
A cada coisa sua finalidade:
Tu és o fim de tudo o que eu sou.
sábado, 13 de outubro de 2007
Choras entre dentes
respiras devagar
vejo-te chorar
e sei que tremes quando mentes.
Passas a língua nos dentes
cheiras o ar
ouço-te silvar
e não acredito no que pensas que sentes.
Ranges os dentes
choras a dormir
sem te lembrares no dia a seguir
e nem eu deixo que tu tentes.
quinta-feira, 11 de outubro de 2007
Pequenos deuses
que se adora apenas
a si mesmo
esperando o dia
em que poderá adorar,
talvez,
outro alguém.
Os seus filhos, talvez.
Pequenos rebentos de Narciso,
rebentos de mais ninguém,
pequenos deuses
de nariz redondo
e olhos macios.
Então, ele será Zeus
e eles serão
os seus pequenos
Hermes, Afrodite
e Zagreus.
Por ora, espera.
Espera pela Hera,
que não passa ainda de um rebento
também,
espera que lhe cresçam as folhas
verdes e persistentes
e os cabelos castanhos.
Espera
que ela o envolva com os seus braços ondulantes
delgados e flexíveis
que lhe aperte o peito
e lhe corte a respiração
que lhe aperte a garganta
e lhe faça perder a voz
que lhe aperte a cabeça
e o faça perdê-la.
Que o aperte até deixar de se sentir
para além da pulsação
como se fosse uma massa de sangue apenas
flutuando
centímetros acima do chão.
segunda-feira, 1 de outubro de 2007
Eu sei.
Sei tanto, tanto, tanto.
Mas dou por mim ainda a fazer as mesmas perguntas, numa repetição exaustiva. Incansavelmente. Porque é que há tanto tempo atrás, da última vez, engoli a poção da invisibilidade para não me veres tremer, para não me veres deitar no chão, para não me veres cair, para não me veres gritar, para não me veres arrastar os pés em silêncio, para não me veres fugir outra vez, para não me veres esconder as lágrimas, para quê? Ainda conheço a tua nuca mas mesmo quando sei que não és tu permito-me duvidar por uns instantes, embriagando-me no prazer culpado que a tua presença fantasma me traz. Porquê? Leio as cartas que nunca chegaste a enviar. Ouço as palavras que nunca cheguei a dizer. Repito-as baixinho ou para dentro, conforme estou sozinha ou não. Para quê? Pergunto-me se ainda tens a mesma maneira de sentir, a mesma maneira de olhar. Ainda somos iguais? Ou já mudámos demasiado? Os rumos podem ser assim tão cruéis com a essência? Porque não me calo por dentro como por fora? Ou porque não falo do que sinto? Porque não te faço lembrar? Ou porque não esqueço também? Eu sei... É o meu castigo. Há-de durar tão para sempre quanto eu.
Estamos mortos há tanto tempo mas nunca parámos de ressuscitar sem que no entanto estejamos alguma vez realmente vivos. Está tudo na minha cabeça, eu sei.
Nunca tive dúvidas no que te diz respeito. Bastou a primeira palavra para saber.
terça-feira, 4 de setembro de 2007
Silêncio, Escuridão, E Mais Nada.
E mais nada.
quinta-feira, 14 de junho de 2007
A Prata da Casa
Esta fragilidade oprimia-me. Constrangia-me. Não sabia o que lhe havia de fazer. Onde o colocar. Como lhe tocar. Ou deixar que lhe tocassem, mesmo ao de leve. Ou se confiá-lo a alguém merecedor. Se tal existia. Era preciso dar-lhe um rumo. Arrumá-lo.
E um dia a resposta chegou. Fi-lo atravessar uma corrente de prata e prendi-a em volta do pescoço. Agora pende-me sobre o peito e dali não mais sairá. Está seguro, até que eu o perca, como perco às vezes a cabeça, ou até que a corrente se parta. Aqui fica o meu coração de prata.
terça-feira, 8 de maio de 2007
Sala de Espera
quarta-feira, 28 de março de 2007
Uma fonte no deserto.
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007
Para a Finlândia, com amor.
Tão longe que estava agora. Teria algum dia percebido verdadeiramente o seu valor? A importância desmedida que tinha para umas quantas almas perdidas? A forma como quase sempre dizia a coisa certa na altura certa? E como sabia pedir desculpa na altura certa se dizia a coisa errada. Se por vezes usava o orgulho como escudo, quase sempre sabia ceder à humildade. Rapaz de gestos exuberantes e olhar tímido. Homem de palavras sábias e pensamentos puros. Hesitante na expressão das emoções apaixonadas. Cheio de contradições, como uma verdadeira pessoa, e sempre tão certo, como mito a idolatrar.
Os adjectivos abundam, cansativamente. Para quê desenhar em palavras aquilo que apenas se sente? É tão mais difícil que um abraço. Mas se o corpo não está presente, é preciso abraçá-lo com verbos.
Deixaste para trás um vazio tão grande, tão grande, tão grande, tão grande… Não há nada que o possa preencher. Nem cartas de nove páginas que façam chorar, nem fotografias em situações inusitadas que façam rir. Só o teu regresso. Enquanto isso, vamos balbuciando entre cafés e cigarros que perderam a graça sem ti a reclamar do fumo e a alertar contra as doenças do pulmão, “Tenho tantas saudades…”, “Faz tanta falta…”, “Que vai ser de nós sem ele?”, “Ainda só passou um mês e parece um ano… Acho que não aguento mais dois…”, “Vamos ter com ele… Podíamos, sei lá… apanhar um avião…”, “Queria tanto que ele estivesse aqui para ver isto…”, “O João é que ia achar piada…”, “Vamos dizer que temos uma doença terminal e precisamos que ele volte…”
A nossa doença terminal chama-se mesmo saudade. Mas não é bem terminal, vive em constante estado de evolução, e apesar de sabermos que se agrava a cada dia que passa, a cada fim-de-semana em que quase não nos apetece sair porque sem ti não é a mesma coisa, também sabemos que tem cura. Sabemos que quando terminar vai ser porque te temos de volta. E torna-se doce a saudade. Porque significa apenas como és elementar, meu caro Watson.
Contar-te os meus segredos por e-mail não é a mesma coisa. Mas sei que quando voltares vou gostar de descobrir a mudança em ti. O crescimento. As tuas novas compulsões (não me digas que são as mesmas?). Vais ter tanta coisa para nos ensinar. Não espero que tragas respostas para a vida, nem para o amor, por mais que penses neles. Mas quando nos pudermos rir todos juntos outra vez, e voltar a discutir incansavelmente as eternas questões e os eternos problemas que desde que existimos nos assolam as conversas, estes três meses vão ser a melhor coisa que nos aconteceu. Porque está a ser a experiência da tua vida, e se é importante para ti, é importante para nós. São uns chatos, os amigos. Sempre colados às nossas ideias. Parece que não têm vida própria ou o camandro.