domingo, 22 de fevereiro de 2009

Amo-te.

Às vezes gostava que fosse como nos sonhos, qualquer caminho que se siga é estranhamente certo e vai sempre dar a algum lugar, longe ou perto. Todos os gestos têm significados profundos, as palavras são misteriosas mas incisivas. São belos os meus sonhos, gosto de dormir neles. São confortáveis e quentes, como a minha cama. Gosto quando me tocam nos meus sonhos porque nunca me incomoda e só me toca quem eu desejo. A imagem do sorriso dele enche o ecrã da minha mente adormecida, o som da sua gargalhada divertida contagia a gargalhada que sinto no coração enquanto durmo. A mão que me afaga o rosto é grande e macia. As palavras ditas e trancadas no sonho, em segredo absoluto do mundo, enchem-me de esperança. Passo-lhe os meus longos dedos pelo cabelo, em retribuição, devagar. E fica tudo bem. Fica sempre tudo bem. Acordo com o telefone e respondo de voz estremunhada, arrastada, dolente. Não queria sair do meu sonho, revolto-me cheia de sono e de raiva. A voz que me fala, carinhosa, não é a mesma que sonhava há minutos, nem o sorriso, nem o cabelo, nem as mãos, nem as palavras. Não está comigo. O meu rosto contorce-se numa agonia silenciosa. A minha boca abre-se num grito mudo e ensurdecedor, e o quarto enche-se dele. Os olhos estão húmidos mas nenhuma lágrima se atreve. Já desliguei o telefone. A culpa já me pesa desde o segundo em que acordei. Tento voltar ao sonho, fechando os olhos com desespero, mas esta minha culpa é esmagadora e não mo permite. Por entre o meu esgar interminável, da minha boca entreaberta, escapa-se um gemido incontrolado. Dura apenas um segundo, logo abafado pelo lençol que mordo em soluços secos. Não faço um som. O coração dentro do peito dói-me e pesa como uma grande pedra aguçada. Às vezes penso que se me alimentasse melhor o sangue me correria mais fácil e fluidamente pelas veias. Dói-me cada momento de vida. Fixo o tecto e tento limpar os pensamentos, em imobilidade total. Volto a libertar os meus músculos e permito-me, não, obrigo-me a levantar. És tão forte. Não tenhas medo. Está um dia lindo lá fora. Amo-te. Sorri.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

tough love

girls deceive
and make boys believe
boys lie
and make girls cry

love hurts
and there's no way around it
but sometimes i wish
i was on the other side of it

boys cry
and make girls believe
girls lie
and make boys deceive

love is tough
but i am tougher
don't you be rough
or you're one dead lover

girls cry
and make boys lie

love is vile
but i love it
if you see me smile
just go with it

boys deceive
and make girls lie

love is cold
when my bed is empty
no hand to hold
no use for my warmth

girls believe
and make boys cry

i want to hurt love
like it hurt me
i want it dead cold
i'll show it villany

boys do something
that makes girls want to die
girls do everything
to pretend it's just fine

i can't decide wich way it goes
so i'll wrap it up
in few simple words

we all fucked up
and tied our own rope
but while there is love
there is still hope

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Fim de um Inverno.

No meio da confusão dos corpos era difícil distinguir onde estava a verdade. Fechava os olhos e era como se os mantivesse abertos. A sucessão de imagens que lhe cruzavam a mente, fazendo o sangue subir-lhe às faces, correspondia à velocidade frenética de movimentos que a rodeavam. Era apenas uma rua cheia de gente com pressa para passar, pouco se importando com os encontrões que dava ou recebia ou com os calcanhares que pisava; mas parecia um quarto fechado, de janelas embaciadas pelas respirações sincronizadamente ofegantes. Nunca uma multidão lhe parecera tão obscena. Nem mesmo os grossos e compridos casacos invernais conseguiam esconder a nudez insípida e desinteressante a que estavam condenados. Apenas o conforto de um rosto belo no meio da orgia de transeuntes lhe pode acalmar a repugnância. Caminhava como que acima da multidão. Em perfeição. E vinha a sorrir, muito ao de leve. Muito ao de leve, cruzou o ombro com o seu. Foi um roçar delicado, como o sorriso, mas o suficiente para que deixasse de lado o seu profundo desprezo pelo mundo, apenas por um instante. O seu coração dorido deixou de arder por um instante, só por constatar que ainda existia uma réstia de gentileza no mundo. Talvez valesse a pena respirar mais um pouco, talvez até encontrar o próximo sorriso perdido na rua que restaurasse em si a vontade de caminhar devagar. Mesmo sem abrir o guarda-chuva.

*

“If love is shelter/I’m gonna walk in the rain”

If Love Is a Red Dress (Hang Me In Rags), Maria McKee