segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Antílope

Ah, por dentro, por dentro, de dentro.
Sempre para dentro, para o umbigo.
É na barriga que se acumulam as sensações.
Por dentro.
Tenho a barriga cheia de emoção.
Trinco pastilhas para a azia,
para apagar o fogo que me consome por dentro,
mas não se extingue.
Custa-me não confundir uma coisa com a outra.
É com esforço que separo o que é corpo do que não é.
Mas nunca chego a saber se não é.
Eu acho que é.
É físico, isto que sinto.
Sinto com o corpo.
São células e coisas científicas.
São bocados físicos de mim que ardem e se contorcem,
de emoção.
Emoção, sensação, impressão.
Coisas que sinto de forma não completamente imaginada.
Talvez isto inche quando chega ao cérebro.
Talvez ganhe dimensão com as ideias que nascem da minha barriga.
Proporcionalmente.
E as emoções ganham quase uma qualidade simétrica, geométrica, quantificável.
Hoje sinto na barriga a emoção equivalente a um antílope.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Do saber esperar.

Às vezes penso que vou esperar para sempre. Gabo a mim mesma a minha enorme paciência mas até eu tenho momentos de dúvida. Às vezes tenho vontade de desistir, vontade de esquecer, vontade de ser egoísta para sempre. Às vezes quero procurar um prazer simples, sem quaisquer intenções nobres à mistura, sem ser maior do que ninguém, sem as presunções de uma moralidade auto-imposta. Esta vigilância constante cansa-me. É difícil ter bons sentimentos quando os faço durar tanto. A solidão torna-se confortável ao fim de algum tempo e o amor é de facto o lugar mais estranho de todos. Quando chega ao fim sinto alívio porque posso voltar a mim, voltar para mim, ao meu egoísmo, à minha solidão confortável, ao meu normal.

Claro que as leis universais não se aplicam a mim. Nem tudo se transforma. Há coisas que se perdem. Eu podia dizer que o grande amor que tenho dentro de mim se transforma nestas palavras e por isso não se perde e é valioso. Mas seria mentira. Também podia dizer que são dor. Mas também não seria verdade. A minha dor já deixou de ser dor há muito tempo e agora é apenas nostalgia. As palavras são o que são. São a minha ficção egocentrada.

Isto não quer dizer que eu não seja feliz. Sou talvez uma das pessoas mais felizes que conheço. E eu conheço-me bem, que não restem dúvidas disso só porque às vezes ainda me consigo surpreender. E mal posso esperar pela próxima grande surpresa. Mal posso esperar pelo momento em que vou perder a paciência, o momento da explosão, do desastre, da fúria devastadora, da revolução. É por esse momento de revolta contra mim mesma que espero. Pacientemente, espero pelo momento em que não vou esperar mais.