domingo, 22 de novembro de 2015

Poema outonal

É o Outono, claramente.
É tudo a ficar mais frio, mais indiferente.
É tudo amarelar-se e cair devagar.
É eu não ouvir nada

porque está tudo submerso em chuva,
como um cobertor de água ruidosa
que me separa do resto do mundo.

É escrutinar o passado e não querer saber o futuro.
É engolir em seco sobre a garganta cansada.
É pestanejar devagar
para fazer durar o tempo em que se está de olhos fechados.

É ser-se assombrado por memórias de coisas que não aconteceram
e as emoções sobre isso serem mais fortes
do que a dor de um dedo cortado em papel.
É, claramente, Outono.

terça-feira, 30 de junho de 2015

Poema da juventude eterna

É deste modo que
sou lembrada
da fealdade
da violência
do potencial desastroso
que há em mim

Ao atravessar uma passadeira
e ao conversar com amigos

Desprezo a humanidade
e peço pelo escuro
e por música alta
e cruel

que pode muito bem ser Wagner

E é por isso
que vou viver para sempre

quinta-feira, 30 de abril de 2015

pequenez

pequenos acidentes
pequenas felicidades
dores de dentes
e incomparáveis atrocidades

uns poucos presentes adocicados
fazem estender o suplício
dos dias envenenados
a catalogar a vida como vício

ao correr
consigo arrastar a cabeça
em lugar de arrastar os pés

quarta-feira, 18 de março de 2015

Para esquecer

Vamos esquecer isto tudo
ou então finjamos
que foi uma lição de vida
que teve qualquer significado
que não foi sofrido para nada

isto tudo, esta coisa
esta raiva
desesperada e impotente
de o ar ser sólido
a entrar pelas narinas
e a colar-se à pele e à roupa
e a fundir-se com o meu cabelo,
de o ar ser composto
de infelicidade e de ignorância
e mais nada - nada.

E isso impregnar-se em mim.

Aqui, nenhum sorriso é sincero
e todos os olhos procuram a saída

e eu dissolvo-me,
escorro lentamente pela cadeira

e só fico triste

faz-me pena

e lamento-me

mas não é possível fingir que isto foi outra coisa.